Artur da Távola
(in memorian)
Não é o mais brilhante mas
é o mais sutil, delicado e penetrante dos sentimentos.
O mais independente, também.
Não importam o tempo, a ausência, os adiamentos,
as distâncias, as impossibilidades:
quando há afinidade, qualquer reencontro retoma
a relação, o diálogo, a conversa,
o afeto, no exato ponto em que
ele foi interrompido,
ontem ou há 40 anos.
É não haver tempo mediando a vida.
É uma vitória do adivinhado sobre o real.
Do subjetivo sobre o objetivo.
Do permanente sobre o passageiro.
Do básico sobre o superficial.
É rara.
Mas quando existe não precisa de
códigos verbais para se manifestar.
Ela existia antes do conhecimento, irradia durante
e permanece depois que as pessoas
deixaram de estar juntas. O que você tem dificuldade de
expressar a um não afim, sai simples e claro
de sua boca diante de alguém
com quem tem afinidade.
É ficar de longe pensando
parecido a respeito dos mesmos fatos que
impressionam, comovem ou mobilizam.
É ficar conversando
sem trocar uma palavra.
É receber o que vem do outro com
uma aceitação anterior ao entendimento.
É sentir com. Nem sentir "contra",
nem sentir "para", nem sentir "pelo".
É sentimento singular, discreto.
Não precisa nem do amor.
Pode existir quando ele está presente
ou quando não está.
Independe dele mesmo sendo sua filha.
Pode existir a quilômetros de distância. É adivinhado na
maneira de falar, de escrever, de andar, até de respirar.
É linguagem
secreta do cérebro,
ainda não estudada.
Além de prescindir do tempo
e ser a ele superior, ela vence a morte
porque cada um de nós traz afinidades
ancestrais no inconsciente e que se
prolongam nas células dos que nascem de nós e
vão para encontrar sintonias futuras
nas quais estaremos presentes
mesmo mortos (mortos?) há tantos anos.
É ter estragos semelhantes
e iguais esperanças
permanecentes.
É conversar no silêncio,
tanto das possibilidades exercidas
quanto das impossibilidades vividas.
É retomar a relação no ponto em que
parou sem lamentar o
tempo da separação.
Porque ele (tempo) e ela
(separação) nunca existiram.
Foram apenas a oportunidade dada (tirada)
pela vida, para que a maturação
comum pudesse se dar.
E para que cada pessoa possa ser, cada vez
mais, a expressão do outro sob a
forma ampliada e refletida do
eu individual aprimorado.
Sensível é
a afinidade.
E exigente, apenas
de uma coisa: que as
pessoas evoluam parecido.
Que a erosão, amadurecimento
ou aperfeiçoamento
sejam do mesmo grau.
***
Paz e Bem a todos !!!
Luiz_FRC_Psycneurosciense