Por que Lacan disse que “A Mulher não existe”?
Creio
que essa frase seja uma das mais polêmicas já proclamadas pelo
psicanalista Jacques
Lacan.
Mas
creio também que isso se deva ao fato de a
maior parte das pessoas não entenderem porque Lacan a
disse e considerá-la apenas como mais uma
justificativa para o preconceito segundo o qual a Psicanálise é machista.
Portanto,
vamos tratar de botar os pingos nos “is”.
Uma
das características mais geniais de Lacan era a sua capacidade de pegar as
teorias elaboradas por Freud e tirar delas algumas frases de
efeito.
Esse
é o caso de “A
Mulher não existe”.
É
óbvio que Lacan não está dizendo que os seres do sexo feminino (com vulva,
vagina, ovários e etc.) não existam.
Ele
não era psicótico a esse ponto.
O que
ele está dizendo é que as mulheres existem, mas A
Mulher não.
Para
entender de onde ele tirou isso, convido meus caros leitor e leitora para um
exercício de imaginação.
Imaginem
que vocês se encontram por volta das idades de 4 ou 5 anos.
Agora,
se imaginem (nessa
idade)
vendo os corpos nus de um menino e de uma menina. Qual a primeira diferença que
vocês irão notar?
É
óbvio: que no menino há
uma coisa entre as pernas e
que na menina não
há uma coisa no meio das pernas.
Lembrem-se:
nessa época (4 a 5 anos) a gente, mesmo que tenha lido os livros de
ciência, ainda
não tem como certa a existência do órgão sexual feminino (a
vagina).
Então,
o que a gente vê é que no menino há
uma coisa e na menina não
há uma coisa.
Qual
a conclusão mais óbvia a ser tirada dessa visão?
A
de que o menino possui aquilo
que na menina falta.
Então,
senhoras e senhores, como vai se inscrever na cabecinha de todos nós a diferença
entre os sexos, quer dizer, como
é que a gente vai interpretar o que é homem e o que é
mulher?
A
partir desse objeto que o homem tem e a mulher não tem.
Portanto,
na nossa cabeça (Lacan diria, na
ordem simbólica) a gente tem como dar uma resposta para a pergunta
“O que é o homem?”.
Qual
resposta?
“O
homem é aquele que possui o objeto”.
Agora,
para saber o que é a mulher a gente só tem uma definição negativa:
“A
mulher é aquele ser que não é homem, ou seja, que não tem o
objeto”. Mas
essa resposta não serve!
Afinal,
a gente poderia dizer: “Beleza, se
a mulher não é o homem então o que ela é?”
É
uma pergunta para a qual não se tem a resposta porque no caso da mulher não há
esse objeto que a represente.
Conclui-se
então que a
idéia do que é a mulher, de sua essência, de seu desejo realmente não
existe. Por quê?
Porque
diferentemente do homem ela não tem um objeto que a represente – esse objeto
Freud chamou de “falo”.
Então,
na nossa cabeça, no mundo simbólico, a mulher não tem representação.
Por
isso, Lacan diz que “A Mulher (e aí a gente pode completar
com: “A
mulher enquanto representação do que é a mulher”) não
existe”.
Isso
é ruim?
Ao
meu ver, muito pelo contrário!
Meus
alunos e alunas de aulas particulares conhecem muito bem o que penso a respeito
disso.
Se
a mulher não tem uma representação de si mesma, isso significa que ela pode
inventar sua essência! (e o
homem não)
É por
isso, por exemplo, que nenhuma mulher gosta de encontrar numa festa outra
mulher com o mesmo vestido dela.
Mulher
gosta de se sentir única, singular, exatamente porque ela não tem uma definição
padrão do que é ser mulher.
Já
homem não.
Homem
gosta do mesmo, do padrão.
Numa
festa de gala, estão todos de terno. São raríssimas exceções os que querem se
diferenciar – e não são vistos com bons olhos.
Por
isso, quando ouvir por aí um lacaniano dizer que “A Mulher não existe”, dê
graças a Deus, pois ao “não existir” ela precisa “se fazer
existir”, cada
uma a seu modo…
Lucas Nápoli
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